Sou emigrante. Por vários motivos, um dos quais
porque sou uma "nómada sedentária". A frase "wherever you go,
there you are" sempre me fez sentido, mas agora ainda mais.
Sou portuguesa, está-me nas moléculas o sal do mar,
o clima ameno, todos os "inhos", o bacalhau, o cozido, o bom vinho,
os pastéis de nata, o verde do Minho, o azul cinza do Tejo, a planície do Alentejo, a ria Formosa, as
cores dos Açores, os queixumes, os brandos costumes, os cravos. Eu quis negar,
mas sou.
As razões que me
levaram a partir estão na minha genética, literalmente. Fez-me partir a pacatez
do povo que nunca pegará em armas para fazer revolução. Os meus genes fazem-me
ir a manifestações, escrever reclamações, ter raiva, ter vontade de pôr bombas.
Os meus genes ditam-me a completa inapetência para usar a violência mesmo
contra os canalhas que continuam impunemente a estragar a vida e o país. Os
meus genes ditam-me a aventura, a capacidade de adaptação, a delicadeza, a
saudade.
Já não penso que somos desorganizados, sei agora que Portugal
é um país limpo, "arranjadinho", lindo. Sei que a nossa maior qualidade
é a nossa maior fraqueza: somos tolerantes.