Em
São Paulo, metrópole brasileira de treze
milhões de habitantes, havia um bairro chamado Vila Madalena. Sim,
chamava-se mesmo
Vila, apesar de ser dentro da cidade, e destacava-se de todos os
outros por ser boémio, de noites longas e muita
diversão. Não
era o único assim.
Outros tinham nomes como Vila Mariana, Vila Prudente
ou Vila Olímpia.
Nas ruas ortogonais e antigas desse
bairro, fundado por portugueses
no início do século XX, por entre a azáfama dos bares, havia um
sitio onde se alojavam viajantes de todo o mundo. Era uma pousada da
juventude.
Lá
dentro, no bar, todas as noites aconteciam eventos
culturais. Desde concertos a sessões de DJs, vernissages ou
serões de poesia. Nessas horas de grande bulício, esfolava-se em
suor o funcionário Pedro. Jovem paulistano, de aspecto franzino e
pele mulata. Todos os dias chegava ao centro da urbe, depois de um
trajecto diário de duas horas desde a sua casa na Zona Leste, área
infame da cidade, devido ao crime violento, tráfico de droga e
pobreza.
Certa
noite, actuavam no palco do bar, os Radiola Project, grupo
musical de samba rock, que estava então a conquistar a cena
musical da cidade. De casa cheia, previa-se que seria uma noite de
boa facturação, mas o empregado Pedro, como sempre, trabalhava
arduamente pelo seu salário. Numa azáfama completa, circulava
constantemente entre a cozinha, o balcão e as mesas. Esta era o seu
Triângulo das Bermudas, e para o cruzar tantas vezes tinha que pedir
com licença aos clientes, com o prato redondo e metálico de garçon
levantado acima das suas cabeças, pelo braço esguio e esticado de
Pedro. Chegadas as três da madrugada, Pedro operava na caixa
registadora, para atender aos vários clientes que estavam de saída.
Dez por cento da conta ia para ele e sabia-lhe sempre bem ver esse
dinheiro na sua mão. Esta percentagem para os empregados, logo
incluída no preço final da factura era prática comum por todo o
Brasil.
Diante
dele, ao balcão para pagar a conta, de pé
na penumbra do ambiente escuro do bar,
vislumbrou dois
homens de trinta e poucos anos, cujo boné de pala arqueada,
dificultava que se lhes visse o rosto. Deram-lhe
uma nota de vinte reais para a mão, equivalente a cerca de sete
euros, apenas para pagar um copo de cerveja. Eles
recolheram o troco de quantia elevada e
foram embora.
Segundos
depois, Pedro estranhava o toque da nota, pois parecera-lhe um papel
de impressão comum, como o que havia no escritório da pousada, sem
uma habitual sensação de aspereza, devida aos pequenos relevos. Retirou a
nota da caixa e observou-a à luz de um pequeno candeeiro. A nota era
falsa! Pedro saiu disparado pela porta e viu
os dois larápios.
“Seus Ladrões! Vão pagar por isto!”
Gritou-lhes. Já em fuga, a
cinquenta metros de distância,
um deles vocifera: “Irmão,
o desenho que está na nota representa a
liberdade. Com ela, fazemos o que quisermos!"
--
João